Nos últimos dias veio a lume a possibilidade de um Zenit S.
Petersburgo – Vit. Guimarães, a contar para a Liga Europa de 2004/05 ter tido o
resultado viciado. A denúncia foi feita por um antigo jogador da equipa russa, que
avançou que elemento do plantel teria pago três mil dólares para subornar o
árbitro. Os russos venceram por 2-1.
A questão da viciação de resultados não é nova, mas é,
naturalmente, difícil de provar. Nos últimos anos têm sido dados como provados
alguns casos de suborno, sobretudo em Itália e em vários países do leste
europeu. Em Portugal, desde o longínquo (1959) caso Inocêncio Calabote – cuja
fama sobreviveu até hoje sem que alguma vez tenha sido evidenciada a
culpabilidade do árbitro eborense – até aos mais recentes episódios do “Apito
Dourado”, poucos casos de compra de resultados foram provados. Se calhar, os
mais mediáticos foram o que levou à extinção do Riopele, o que envolveu a
Sanjoanense e o Paços de Brandão (venceram os seus jogos por 32-0 na última
jornada do distrital de Aveiro, em 1986/87 quando ambos precisavam de marcar
muitos golos para ficar um à frente do outro) e o caso do Famalicão – Macedo de
Cavaleiros, de que o Fafe beneficiou para ascender à I Divisão, em 1988/89. O
árbitro algarvio Francisco Silva foi apanhado com um cheque cuja proveniência
não soube explicar no preâmbulo de um Penafiel – Belenenses, António Guímaro,
de Coimbra, também foi apanhado, tal como o presidente do Leça, Manuel
Rodrigues.
É meia-duzia de casos quando anualmente se disputam milhares
de jogos para dezenas de competições. Claro que um único caso de resultado
viciado é um caso a mais, mas não se pode dizer que o suborno (a árbitros ou a
jogadores) seja moeda corrente no Futebol, pelo menos casos provados.
No entanto, no Record de hoje, o presidente Centro
Internacional da Segurança no Desporto, entidade que zela para segurança e
integridade do desporto, Mohammed Hanzab, afirma que “jogos combinados são já
uma praga pior do que o doping”. Acho interessante a comparação e concordo com
a afirmação.
Já aqui escrevi muitas vezes que a melhor forma de combater
o doping é descriminaliza-lo. Por paradoxal que pareça à primeira vista, o
insucesso do programa anti-dopagem fica demonstrado de cada vez que um atleta é
apanhado (se todos tomarem as mesmas coisas, deixa de fazer sentido tomá-las e
serão sempre os melhores a ganhar). Lembro-me sempre do desabafo de Joaquim
Agostinho de uma das vezes que acusou positivo: “tomo o que todos tomam…” disse
aos jornalistas. E disparou: “Vão lá vocês subir os Alpes a comer bife e
batatas fritas”.
Claro que as coisas estão hoje muito mais refinadas do que
no tempo de Agostinho. Lance Armstrong só foi apanhado muitos anos depois de
começar a dopar-se, mas Mohammed Hanzab também diz que “o match fixing utiliza
tecnologia muito desenvolvida”…
Se a questão do doping ficaria resolvida com a sua
despenalização, já quanto à fixação de resultados sou de opinião diferente. Caso
contrário, o Futebol passaria a ser exclusivamente um espetáculo, ao melhor
estilo da Luta (Wrestling), totalmente desprovido da componente competitiva e
em que os espetadores se deslocam aos estádios sabendo antecipadamente quem vai
vencer.
Além da sua beleza estética, foi a incerteza dos resultados
que fez com que o Futebol se tenha afirmado como modalidade desportiva capaz de
arrastar milhões. Se é certo que as melhores equipas ganham mais vezes, as
equipas teoricamente mais fracas utilizam as armas que têm e, muitas vezes,
acabam por conseguir vitórias heróicas. E disso, a história está repleta de
exemplos, desde a eliminação do Sporting dos Cinco Violinos por um Tirsense da
III Divisão, ao Campeonato da Europa ganho por uma mão cheia de dinamarqueses
em férias. Retirar aos adeptos a incerteza do resultado, porque este é previamente
decidido por alguém, é matar o Futebol.