quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

País de brandos costumes

A direção da Académica vai apresentar uma proposta à Câmara Municipal para requalificar o estádio Efapel Cidade de Coimbra. A principal alteração prevista é a remoção da pista de atletismo, com a respetiva aproximação das bancadas ao terreno de jogo.

O estádio Efapel Cidade de Coimbra foi construído para o Euro 2004. A candidatura portuguesa para acolher a fase final da competição propunha dez estádios, uns construídos de raiz, outros com renovações mais ou menos profundas. Na altura levantaram-se vozes que condenaram a megalomania de Portugal: havia quem considerasse que oito e mesmo seis estádio seriam suficientes para receber os 32 jogos previstos. Mas não: foram mesmo dez as mega obras que se realizaram, já num contexto de abrandamento económico, mesmo se longe ainda da crise que começou a fustigar o País a partir de 2008.

É publicamente reconhecido – hoje – que os dez estádios foram um exagero. Só os estádios D. Afonso Henriques (Guimarães), Axa (Braga), Dragão (Porto) e José Alvalade e Luz (Lisboa) têm uma capacidade que justifique o número de espetadores. O Estádio do Bessa é demasiado grande para acolher os espetadores de um Boavista que milita no Campeonato Nacional de Seniores; com o Municipal de Leiria, palco dos jogos da Un. Leiria, acontece a mesma coisa, embora, neste caso, haja um aproveitamento do espaço para competições de atletismo de alguma relevância internacional. Aveiro e Faro / Loulé são autênticos elefantes brancos e há quem defenda a respetiva demolição, de tal forma são incomportáveis os custos de manutenção. 

No caso do Efapel Cidade de Coimbra, é, ele também, demasiado grande para a Académica, única equipa que o utiliza. A pista de atletismo atingiu um estado de deterioração que nem homologada está pela Federeção e é apenas utilizada esporadicamente, para treinos. Em resumo: um desperdício.

É legítimo que a direção da Académica queira aproximar o público da equipa e retirar do estádio uma pista de atletismo completamente inútil. O que custa é que não sejam responsabilizadas as entidades – e as pessoas que as dirigiam – que tomaram a decisão de a construir. Quanto custou e continua a custar esta decisão ao erário público? A má gestão de dinheiros públicos deveria ser punida. A gestão danosa é crime, mas Portugal continua a ser um país de brandos costumes.

Palavras leva-as o vento

A Naval 1º de Maio iniciou a fase de manutenção do Campeonato Nacional de Seniroes com um grupo de 29 jogadores dos quais apenas quatro estavam no plantel que iniciou a temporada. Sendo a Matemática uma ciência precisa, La Palice diria que os figueirenses encaram a batalha pela permanência com nada mais nada menos de que 25 caras novas.

Os reforços têm diversas proveniências: vários vêm de clubes da região de Lisboa e da zona a sul do Tejo, por certo devido à influência de Tiago Raposo, que esteve ligado ao Pinhalnovense; há três jogadores que chegam do QPR e quatro dos angolanos do Bravos de Maquis. 

O que espera estes futebolistas, jovens na sua maioria? Se olharmos para o passado recente do clubenão se avizinham coisas boas. No entanto, se olharmos para o futuro, o horizonte pode ser ainda mais negro. A Naval enfrenta dois Processos Especiais de Revitalização (um a nível do clube e outro a nível da SAD) e muitos observadores antevêem o fim do clube.

Na apresentação do plantel à Comunicação Social, o histórico presidente navalista Aprígio Santos prometeu que “não deixarei morrer este clube”. Ora Aprígio Santos, enquanto presidente da Direcção é um dos principais responsáveis pela situação a que a Naval chegou. Como muitos dos que passaram pelo clube sabem, palavras leva-as o vento. Dirigentes pouco escrupulosos é que, infelizmente, não.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Haja coragem!

Tinga, que passou fugazmente pelo Sporting há cerca de dez anos, representa actualmente o Cruzeiro. A equipa brasileira deslocou-se recentemente ao Peru para defrontar o Real Garcilaso num jogo a contar para a fase de grupos da Taça Libertadores. A partida ficou marcada por cenas lamentáveis com os adeptos da equipa da casa a manifestarem atitudes racistas sempre que Tinga tocava na bola.

Nestas coisas, o resultado do jogo importa pouco. Importa mais o comportamento dos adeptos e a forma como as autoridades desportivas vão agora lidar com o assunto. É público que sempre que Tinga tocava na bola (entrou aos 66’), os adeptos do Real Garcilaso imitavam macacos. Após o jogo, Tinga, de 36 anos, teve uma das melhores jogadas da sua vida quando disse que “preferia não ter ganho todos os títulos da minha carreira e conquistar o título contra o preconceito desses atos racistas. Trocaria tudo por um mundo com igualdade entre todas as raças e classes”.

Nas redes sociais, foram muitos os jogadores brasileiros a solidarizarem-se com Tinga. Ronaldo, Ronaldinho, Neymar, Pato e David Luiz são apenas alguns exemplos. Jogdores, treinador e dirigentes da equipa peruana pediram desculpa e a própria presidente do Brasil, Dilma Roussef veio a público dizer que “foi lamentável. Acertei com a ONU e com a FIFA que o nosso Mundial será a Copa contra o racismo, porque o Desporto não deve ser jamais palco para o preconceito”. São, naturalmente palavras bonitas, mas que perdem sentido se não forem acompanhadas com penalizações concretas e severas ao clube a que pertencem os adeptos racistas. 

Em Portugal, na época passada, Nacional e Leixões foram obrigados a fazer um jogo à porta fechada, como pena por adeptos seus entoarem cânticos racistas. A “coisa” passou mas não deve ser esquecida. Parece-me, de qualquer maneira, que jogar à porta fechada não é castigo suficiente para os clubes de adeptos com este tipo de comportamento. Na minha opinião, deveria avançar-se para a perda de pontos dos clubes a que os adeptos pertencem e para a interdição destes frequentarem recintos desportivos. Assim haja coragem.

PS - A proibição de frequentar recintos desportivos deveria ser alargada àqueles que, sobretudo nas bancadas do Estádio do Dragão, incentivam a sua equipa lançando imprópérios às mães dos adeptos de um clube rival. De uma forma mais geral, também àqueles que parecem conhecer bem as mães dos árbitros...

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Regabofe

No dia em que o treinador da Académica cumpre o segundo de três jogos de castigo, na sequência de uma suspensão de 20 dias, foi anunciado que o F.C. Porto foi multado em 383 euros por ter atrasado o início da sua partida com o Marítimo a contar para a Taça da Liga. Ambas as penas foram impostas pelo Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol.

O castigo ao F.C. Porto surge após uma queixa do Sporting. A equipa leonina julgou-se prejudicada pelo facto dos dragões, seus concorrentes diretos, começarem a jogar depois da hora marcada e, portanto, poderem “jogar com o tempo”, em função do resultado que sabiam verificar-se no jogo do seu adversário. Mais do que os regulamentos, o bom senso manda que jogos entre adversário diretos comecem à mesma hora.

Que seja bem claro: entendo que o F.C. Porto não ganhou o acesso à meia final da Taça da Liga porque o seu jogo começou depois daquele que o Sporting disputava em Penafiel. É verdade que os portistas marcaram dois golos já depois dos sportinguistas terem acabado o seu jogo, mas isso, para mim, é dado acessório.

No meu entender quem fica mal na fotografia é a Liga, como já aqui escrevemos. É à Liga que compete assegurar que os jogos comecem à hora marcada, ou, se isso não for possível, por se registar um atraso numa das partidas não permitir que o outro jogo comece, de forma que ambas os desafios comecem em simultâneo.

É pois a Liga de Clubes que, com a sua negligência, permite que se lance um manto de descrédito e de desconfiança sobre a competição e a entidade organizadora, ou seja, a própria Liga.

Voltando a Sérgio Conceição, a pena de que é alvo, está relacionada “com a lesão da honra e reputação da entidade federativa e da Liga de Clubes”. Após o jogo com o Estoril Praia (0-1), o treinador da Académica afirmou que “fizemos um golo limpo e mais uma vez fomos prejudicados pela arbitragem. Se calhar não nos querem lá em cima na tabela. Somos um clube simpático, até simpático de mais, e as pessoas sentem-se confortáveis para nos prejudicar". 

Não entendo que as palavras do jovem técnico academista lesem mais a honra e reputação da entidade federativa e da Liga de Clubes do que o regabofe em que se tornou a Taça da Liga.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Censura e liberdade de imprensa

Durante muitos anos, lutou-se, em Portugal, pela chamada “liberdade de imprensa”. Reconquistada formalmente com o 25 de abril, data a partir da qual os jornais deixaram de estar sujeitos ao Exame Prévio (eufemismo com que Marcelo Caetano rebatizou a Censura Prévia, instituída em 1926 e consagrada em 1933), a liberdade de informar tem encontrado ao longo dos anos formas subtis de censura. Na maioria das vezes, a censura é velada e exercida sob a forma comercial de não subsidiar, através da compra de espaços publicitários, determinados jornais.

Deixemos clara uma coisa: sou totalmente contra qualquer censura de imprensa. Para mim, essa é a regra zero, a mais importante de todas. Mas, deixo também claro que o Jornalista não pode escrever o que lhe vem à cabeça.

É que o Jornalista tem um peso social grande que lhe vem do papel que exerce: informar para formar. E essa é uma regra que alguns têm tendência a esquecer. Veja-se um exemplo:

Retirado do Record de ontem, num pequeno artigo não assinado, pude ler que “No último jogo do Paços, Carlão entrou a render Buval ainda antes do fim da 1ª parte, andou em campo a pastar, foi assobiado e acabou por ser substituído perto do fim (…)”.

Sinceramente não me parece deontologicamente correto – já para não falar numa questão, ainda mais básica, de boas maneiras, que também se fazem sentir pela linguagem que se utiliza – que se diga que um jogador andou a pastar. Essa é uma linguagem eventualmente aceitável como desabafo na boca de um adepto, mas absolutamente descabida num artigo jornalístico.

Esperei pelo jornal de hoje por um eventual – e improvável – pedido de desculpas do jornalista ou mesmo, porque não?, do Diretor do Jornal. Se esse pedido de desculpas, dirigido ao jogador visado e ao Leitor, tivesse ocorrido, não estaria agora a escrever estas linhas. Mas estamos numa sociedade em que parece cada vez mais difícil as pessoas pedirem desculpas pelo que fazem ou pelo que dizem… Ao contrário, parece cada vez mais fácil dizer-se – impunemente – o que se quer. No caso concreto do jornalista do Record, seria bom que não esquecesse o ditado popular segundo o qual “quem diz o que quer ouve o que não quer”.