quarta-feira, 31 de julho de 2013

A César o que é de César

Tenho muitas vezes, neste blog, assumido um tom crítico relativamente a certas questões que têm a ver com o Desporto em geral e o Futebol em particular. Uma das coisas que mais me choca é a diferença de tratamento, por parte dos órgãos de Comunicação Social, entre clubes ditos “grandes” e os outros.

Há sensivelmente um ano, dei aqui um exemplo e outro aqui de casos de manifesto tratamento diferenciado, apontando o dedo acusador ao serviço público de rádio e de televisão, num caso, e ao jornal Record, no outro.

A bem da verdade, e por uma questão de justiça, devo hoje tirar o chapéu à Antena 1 pela transmissão do relato do jogo que o Estoril Praia vai disputar amanhã, frente aos israelitas do Hapoel Ramat, a contar para a terceira pré-eliminatória da Liga Europa. Da mesma forma que critiquei o facto de a rádio pública não ter feito, no ano passado o relato de um jogo do Marítimo, sublinho e saúdo a inflexão da Antena 1 quanto a esta partida do Estoril Praia.

A César o que é de César.

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Doping - Penalização e despenalização

O tenista sérvio Viktor Troiki foi suspenso por 18 meses depois de ter violado o regulamento anti-doping da Federação Internacional de Ténis. O jogador foi alvo de um controlo anti-doping em abril passado, mas disponibilizou apenas uma amostra de urina, recusando ceder uma amostra de sangue sob o pretexto de se encontrar indisposto.

A luta contra a utilização de doping no Desporto sofreu um grande desenvolvimento ao longo dos anos. A necessidade de tornar as competições mais transparentes obrigou as autoridades a, numa primeira fase, punirem os atletas que recusassem submeter-se a controlo. Quem o fizesse era automaticamente suspenso, como se tivesse mesmo ingerido produtos dopantes, ainda que ninguém o pudesse provar. Posteriormente, a imposição do “passaporte biológico” apertou ainda mais as malhas da lua anti-dopagem.

Apesar de todos os esforços e dos milhões investidos na luta contra a batotice, a verdade é que não se consegue erradicar o doping do Desporto. Nos últimos meses, isso foi por demais evidente, depois de confirmadas as fortes suspeitas que envolviam o ciclista Lance Armstrong, que entretanto tinha atingido o estatuto de herói mundial.  A confirmação de casos no Atletismo, com Campeões Olímpicos e Mundiais suspensos, prova à sociedade que a luta anti-doping é um fracasso. Fracasso que se torna ainda maior de cada vez que alguém é apanhado. O problema é que a investigação para desenvolver as práticas de dopagem andará sempre mais depressa do que a sua repressão.

Como já o disse aqui, há muitos anos que defendo que a utilização do doping no Desporto deveria ser despenalizada. Se todos tomassem a mesma coisa, sem receio de serem apanhados, então seriam sempre os melhores a vencer, a serem mais fortes, a irem mais longe, mais rápido, porque o efeito seria o mesmo para todos. E, se assim fosse, deixaria de fazer sentido tomar produtos para melhorar o desempenho desportivo.

Talvez a sociedade ainda não esteja preparada para a despenalização do doping, mas um dia, isso vai acontecer. A não ser que prefira pensar que um ciclista é capaz de subir montanhas e pedalar 300 quilómetros comendo uma torrada e bebendo uma meia de leite ao pequeno-almoço.

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Entre as brumas da memória

Os  ingleses chamam silly season (época tola, numa tradução literal e livre) àquele período de algumas semanas que medeia duas temporadas futebolísticas. Desconheço a origem da expressão e as razões pelas quais é empregue, mas posso facilmente admitir que se deva às tolices ditas e feitas por diversos agentes desportivos: dirigentes, em primeiro lugar, jogadores e seus representantes legais, etc.

Nesta silly season que estamos a viver, e que ainda vai durar mais cerca de três semanas antes de começar o campeonato da Liga, uma das novelas tem sido a relação entre o Sporting e o seu (ex?) jogador Bruma. O jovem, com quem o Sporting pensava ter contrato, despediu-se do clube e encontra-se em parte incerta, provavelmente sem se preparar fisicamente de maneira apropriada, à espera que o seu futuro seja definido.

Como não sou jurista e desconheço os contornos legais do diferendo limito-me a um lugar-comum: jogador e clube têm legitimidade para defenderem aquilo que pensam ser os seus direitos.

Além da questão jurídica, no entanto, há a questão profissional e humana. Há um jogador que está impedido (mesmo que auto-impedido, se quiserem) de exercer a sua profissão numa altura crucial da temporada, aquela em que os treinadores “montam” as equipas com o plantel que irão ter à sua disposição. O jogador é jovem e tem, ao que parece, um potencial futebolístico imenso. Será que também a forma psicológica necessária para ultrapassar este período atribulado da sua carreira? Espero que sim, porque seria pena que, por uma qualquer tolice, um grande talento se perdesse entre as brumas da memória.

terça-feira, 23 de julho de 2013

Pornografia e obscenidade

A profissionalização da arbitragem ao mais alto nível é o assunto em grande destaque na edição do dia do Record. Ao longo de três páginas – que prometem prolongamento, amanhã – o jornal divulga as bases gerais do estudo de viabilidade levado a cabo por uma multinacional de consultoria, contratada pela Federação Portuguesa de Futebol.

O que retive de mais importante foram três coisas: o aumento, em cerca de um milhão de euros relativamente à atualidade, do custo da arbitragem; a remuneração proposta para os árbitros; e, finalmente, a ideia de deixar de haver promoções e despromoções na categoria mais alta, que se chamaria Elite.

Como já aqui escrevi variadíssimas vezes, não sou um especialista em Futebol e sou-o ainda menos em Arbitragem. Sou apenas um adepto da modalidade. E é enquanto adepto que pasmo com a proposta que tem, promete dizer o Record na sua edição de amanhã, parece merecer a aprovação de 68 por cento dos árbitros que “aceitam o profissionalismo por mais de 30 mil euros”.

Sinceramente, penso que a Federação Portuguesa de Futebol deveria preocupar-se com outras prioridades. A perda constante de adeptos e a diminuição, também constante, no número de praticantes federados deveria, a meu ver, constituir primazia para as altas instâncias do Futebol. Há Associações distritais com dificuldade em organizar as suas competições devido à falta de clubes e, a esse nível, a situação não é mais dramática devido à criação do Campeonato Nacional de Seniores e consequente abolição da antiga III Divisão Nacional.

O principal argumento que tenho lido ou ouvido em favor da profissionalização dos árbitros diz que o Futebol envolve hoje tão elevadas verbas que não faz sentido os jogos serem dirigidos por amadores. Contesto este argumento desde logo porque tenho dúvidas em chamar “amador” alguém que ganha tão bem como um árbitro de primeira categoria, mesmo se a sua remuneração não é feita sob a forma de salário mas sim como prémios, ajudas de custo e outras mordomias.

Acima dessa, elevo contudo outro razão para não concordar com a profissionalização: mesmo tornando-se profissionais, os árbitros não deixam de ser humanos e, logo, sujeitos a errarem. Tal como acontece com o avançado que falha um “golo feito” ou com o guarda-redes que “abre a capoeira”. É verdade que, ao contrário destes, cujos erros prejudicam as próprias equipas, as falhas dos árbitros penalizam terceiros, mas também sei – todos nós sabemos, não é verdade? – que os primeiros falham muito mais do que os segundos. E são profissionais.

Por outro lado, parece-me claramente pornográfica a possibilidade de um árbitro ganhar 72.000 euros ano. No estado atual da economia, é obsceno falar-se destes valores. Ponto.

Finalmente, não posso concordar que deixe de haver despromoções. Em toda a prática desportiva de competição está subjacente que haja um prémio para quem tem mais mérito e um “castigo” para quem tem mais “demérito”. O projeto defendido pela FPF prevê apenas a possibilidade de “despedimento” caso o árbitro não cumpra critérios mínimos de performance. Um pouco como se dissessem aos 16 clubes da I Liga que não desceriam de divisão caso atingissem os 30 pontos, por exemplo. Ora isso não é possível, porque há equipas (árbitros, neste caso) que estando um patamar abaixo pretendem atingir o topo, tendo aí a grande motivação para desempenharem a sua atividade.

Muito mais – muito, muito mais mesmo – haveria para dizer sobre este assunto e a ele provavelmente voltarei em breve. Para já fico na expetativa de ver na edição de amanhã a continuação do trabalho apresentado hoje pelo Record.

domingo, 21 de julho de 2013

Breves

Ao sábado, o Correio da Manhã publica um destacável sobre Desporto. Por mero acaso vi a edição de ontem, com um artigo interessante acerca do livro “Jorge Jesus – O Treinador que mantém a chama imensa”, recentemente publicado pela jornalista Miriam Assor. Bem escrito – o artigo, que o livro eu não li – numa escrita quase literária, mas sempre escorreita, muito fluída.

Além desse artigo, nas centrais do destacável, o Correio da Manhã chamou-me a atenção para frases publicadas nas redes sociais e atribuídas a Cristiano Ronaldo e a Juan Iturbe.

Escreveu o jogador do Porto que “o que mais me incomoda é que as pessoas falem de coisas sem saber. Apenas isso”. Lamento, mas não sei do que está a falar…

Quanto a Cristiano Ronaldo, escreveu: “Quem vai a Boston ver-me jogar com a Seleção Portuguesa contra o Brasil no dia 10 de setembro? Vai ser divertido.”

O jogador madeirense tem sempre frases que oscilam entre o divertido e o triste. O que me choca nesta frase é o facto de o jogador madeirense se referir a ele próprio como sendo mais importante que o jogo em si e que a equipa que representa. O Futebol é um jogo de equipa e a equipa deve ser sempre colocada acima dos interesses pessoais de qualquer dos seus elementos. Mesmo que ele seja (ou fosse) o melhor jogador do mundo.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Jornais e jornalismo

Hoje, coisa rara, comprei dois jornais desportivos. Além do Record, minha compra habitual, comprei também o L’Équipe. A capa chamou-me a atenção, com uma fotografia fantástica de Christopher Froome, o inglês que se prepara para ganhar a Volta à França. A espectacularidade da imagem e a vontade de comparar um dos melhores jornais desportivos do mundo com os seus congéneres portugueses fez-me decidir pela compra.

O L’Équipe custa 1,10 Euro. Em termos absolutos, é mais caro 25 cents do que o Record, A Bola ou o Jogo. Importa no entanto referir que o salário médio mensal em França é de um pouco mais de 2.200 Euro, enquanto em Portugal é de apenas 870. Ou seja, proporcionalmente, o l’Équipe é muitíssimo mais barato. O jornal francês tem uma tiragem média de 380 000 exemplares (65 milhões de habitantes em França); proporcionalmente, o Record, tem uma tiragem média superior, com os seus 84 200 exemplares (Portugal tem 10,5 milhões de habitantes).

Se estas diferenças são facilmente mensuráveis, já a qualidade intrínseca das publicações o é menos. Correndo pois o risco de fazer uma análise subjetiva, aponto algumas diferenças que fazem pender os pratos da balança, claramente, para o L’Équipe.

- Qualidade das fotografias. Ao que parece, o L’Équipe continua a investir em repórteres fotográficos, ao contrário do que acontece com os jornais portugueses, que se limitam a comprar imagens de agências. Um bom exemplo disso mesmo foi dado ontem, quando A Bola, Jogo e Record publicaram na capa imagens idênticas de Rui Costa a ganhar a sua etapa do Tour. Inquestionavelmente, as fotos eram diferentes em milésimos de segundo, mas foram tiradas pelo mesmo fotógrafo, pela mesma câmara, do mesmo ângulo.

- Qualidade da informação. No L'Équipe, a reportagem do Tour, evento desportivo com maior número de seguidores em todo o mundo, é assegurada por nada menos de oito redatores e pelo menos três repórteres de imagem. Os jornais portugueses não têm nenhum enviado especial a seguir a prova, apesar de nela estarem presentes dois ciclistas portugueses. Resultado: oito páginas de reportagem super-interessantes no L’Équipe, com informação completa sobre a prova (incluindo classificação de todos os ciclistas na etapa e na geral). O Record apresenta duas páginas e tem de recorrer à página pessoal de Rui Costa no Facebook para transcrever “declarações” do ciclista português. Quanto a Sérgio Paulinho, nem uma palavra, apenas a sua inclusão nas classificações de etapa e geral.

- Diversidade de conteúdos. No Record, onze chamadas de capa: nove para assuntos relacionados com o Futebol e dois para assuntos extra-desporto, com a despedida de Alexandre Pais do cargo de diretor do jornal e a Miss Fanática 2012/13. Além do Futebol, portanto, nenhuma referência a qualquer outra modalidade desportiva. No L’Équipe, quatro quintos da capa vão para a tal fotografia de Christopher Froome, mas ainda há espaço para o Atletismo e para o Futebol, além de uma chamada para uma entrevista com o ator Bud Spencer.

O L’Équipe apresenta-se em dois cadernos de oito páginas cada. O primeiro é inteiramente dedicado à Volta a França. No segundo caderno, destaque de capa para a Vela, Rugby e o Taekwondo. No interior, notícias sobre Ténis, Golfe, Atletismo, Equitação, Natação, Hóquei no Gelo, Automobilismo, Motociclismo, Tiro com Arco, Basquetebol, Futebol (três páginas), Voleibol e a já mencionada entrevista com Bud Spencer.

No caso do Record, 26 das 32 páginas da edição do dia, são dedicadas ao Futebol, por enquanto ainda sem competições a decorrer. Com mais duas páginas dedicadas ao “Verão”, uma ao “Jogo da Vida” e outra à “Miss Fanática”, resta pouco espaço para se falar das modalidades ditas “amadoras”.

Não tenho dúvidas: Portugal até pode vender, proporcionalmente, mais jornais desportivos do que a França, mas a qualidade do L’Équipe é muitíssimo superior à dos jornais portugueses.